domingo, 7 de setembro de 2025

“Elder – Reflections of a Floating World (2017)


 

“Reflections of a Floating World” marca um ponto de maturidade e expansão criativa na trajetória do Elder, consolidando a banda como uma das mais inventivas dentro do espectro do rock psicodélico e progressivo contemporâneo. Lançado em 2017 por meio da Stickman Records na Europa e da Armageddon Label nos Estados Unidos, o quarto álbum de estúdio é uma obra que transcende rótulos fáceis, transitando entre a densidade do stoner, a amplitude exploratória do prog e a fluidez atmosférica do rock psicodélico.

As seis faixas, todas longas e de estrutura complexa, revelam um grupo que domina a arte da transição e do contraste. O trio central formado por Nicholas DiSalvo, Jack Donovan e Matt Couto apresenta uma coesão notável, com cada instrumento contribuindo para a construção de narrativas sonoras que se desdobram em camadas. O trabalho de DiSalvo nas guitarras e teclados é o eixo criativo, sempre conduzindo as composições de forma a equilibrar riffs pesados e melódicos com passagens etéreas e expansivas. O baixo de Donovan sustenta a amplitude dos arranjos com firmeza e groove, enquanto a bateria de Couto dá ao álbum um senso de movimento constante, alternando precisão técnica e força expressiva.

A inclusão dos músicos convidados Michael Risberg na guitarra e teclados e Michael Samos no pedal
steel foi crucial para ampliar a paleta sonora. O pedal steel, em particular, introduz uma dimensão inusitada, quase cósmica, que reforça o caráter flutuante e hipnótico do disco. Essa escolha demonstra a busca do Elder por um som não apenas mais denso, mas também mais texturizado, com camadas que se entrelaçam de forma orgânica.

Tecnicamente, “Reflections of a Floating World” impressiona pela produção clara e equilibrada, que consegue dar espaço a cada detalhe mesmo em meio à intensidade dos arranjos. As mudanças de andamento e dinâmica acontecem sem rupturas bruscas, o que reforça a habilidade do grupo em construir músicas de longa duração sem perder coesão ou propósito. Os momentos de improviso e jam são moldados com inteligência, permitindo tanto explosões catárticas quanto atmosferas meditativas.

O álbum reafirma a identidade do Elder como uma banda que não teme se reinventar dentro de seus próprios parâmetros. O caráter progressivo não se limita a referências técnicas, mas se traduz na maneira como as faixas parecem se expandir em todas as direções, sugerindo paisagens sonoras vastas e em constante mutação. “Reflections of a Floating World” é, portanto, mais do que uma coleção de músicas; é uma experiência auditiva que exige entrega total do ouvinte, recompensando-o com uma viagem musical intensa, ambiciosa e profundamente inspirada.

Sanctuary
A abertura do álbum já demonstra a ambição do Elder em trabalhar com amplitudes largas. A faixa se constrói a partir de riffs densos, que se alternam com passagens mais contemplativas, quase etéreas. O diálogo entre guitarras cria uma sensação de expansão constante, enquanto o teclado acrescenta texturas cósmicas que reforçam a atmosfera psicodélica. O baixo pulsa com firmeza, conectando os momentos de explosão e calmaria, enquanto a bateria conduz com variações que evitam qualquer linearidade. É um início grandioso, que posiciona o ouvinte dentro do universo sonoro flutuante proposto pela banda.

The Falling Veil
Aqui o Elder explora ainda mais o aspecto progressivo. A canção apresenta uma estrutura mutante, com mudanças de andamento que mantêm a narrativa sempre em evolução. Os riffs assumem uma função quase narrativa, alternando peso e melodia. O trabalho de teclado e guitarra adicional de Risberg amplia o espectro harmônico, criando momentos em que a música parece respirar, abrindo espaço para paisagens sonoras amplas. O pedal steel surge discretamente, adicionando um caráter etéreo, como se fosse um eco distante.

Staving Off Truth
Com um início mais direto e riffs mais marcantes, essa faixa introduz um senso de urgência dentro do álbum. A bateria de Couto é um ponto alto, conduzindo com energia e precisão, enquanto o baixo sustenta linhas sólidas que ancoram a complexidade melódica das guitarras. Os vocais aparecem como um elemento integrado à instrumentação, não como centro da faixa, mas como mais uma camada dentro da massa sonora. A densidade é equilibrada por interlúdios atmosféricos que evitam o desgaste e ampliam a dramaticidade.

Blind
Talvez a canção mais dinâmica do álbum, alterna momentos pesados com seções flutuantes que exploram bem a proposta psicodélica. O pedal steel aqui ganha maior protagonismo, criando um contraste belíssimo com os riffs de guitarra mais ásperos. A faixa se desdobra em uma narrativa longa, em que cada transição de tempo e dinâmica funciona como um capítulo de uma história maior. É uma das composições que melhor exemplificam a habilidade do Elder em unir força e delicadeza.

Sonntag
Funciona quase como um interlúdio instrumental e meditativo dentro do disco. Com forte influência do krautrock e da música ambiente, apresenta uma repetição hipnótica e camadas eletrônicas que sugerem uma suspensão temporal. É um momento de respiro essencial, que prepara o terreno para o encerramento grandioso. A peça mostra o quanto o Elder domina não apenas a linguagem do rock pesado, mas também a construção de atmosferas imersivas.

Thousand Hands
O encerramento é monumental, reunindo todos os elementos que permeiam o álbum. Longa e multifacetada, a faixa se inicia com riffs pesados e cresce em intensidade, alternando passagens de groove denso com seções atmosféricas expansivas. O teclado se integra de maneira natural às guitarras, criando uma tapeçaria sonora rica e cheia de movimento. A bateria mantém o equilíbrio entre força e sutileza, conduzindo a faixa rumo a um clímax arrebatador. É um fechamento à altura da proposta do álbum, deixando a sensação de que a jornada sonora continua ecoando mesmo após o silêncio final.

“Reflections of a Floating World” é um marco na discografia do Elder porque condensa toda a
trajetória da banda até então e a projeta para um território ainda mais expansivo. Nos primeiros trabalhos, como “Elder” (2009) e “Dead Roots Stirring” (2011), o grupo já demonstrava habilidade em criar composições longas, carregadas de riffs densos e atmosfera psicodélica. Com “Lore” (2015), essa proposta foi elevada a um nível mais progressivo, estruturando faixas como verdadeiras narrativas musicais. Em “Reflections”, contudo, a banda atinge uma síntese notável: o peso característico permanece, mas há um refinamento nas transições, maior clareza na produção e uma paleta de timbres enriquecida pela participação dos músicos convidados.

A evolução se percebe especialmente na forma como o Elder lida com a dinâmica e a textura. As guitarras de Nicholas DiSalvo não são apenas veículos de riffs pesados, mas exploram espaços melódicos, harmonias expansivas e diálogos sutis com teclados e pedal steel. O baixo de Jack Donovan ganha importância ao sustentar passagens mais etéreas sem perder densidade, e a bateria de Matt Couto revela maturidade ao variar entre explosões vigorosas e conduções mais contidas, sempre em função do clima da faixa.

Outro aspecto notável é a produção, que consegue equilibrar clareza e força. Cada instrumento encontra espaço na mixagem, mesmo nos momentos de maior densidade. A escolha de timbres é fundamental para o caráter flutuante do disco, em que os contrastes entre passagens atmosféricas e seções pesadas se integram de maneira natural. O uso do pedal steel por Michael Samos adiciona uma camada inédita na sonoridade da banda, criando texturas quase espaciais que ampliam a noção de profundidade.

Do ponto de vista estrutural, o álbum demonstra um domínio crescente sobre composições de longa duração. Não há repetições gratuitas: cada trecho cumpre a função de expandir ou transformar o material temático, o que mantém o ouvinte em constante movimento. Essa habilidade é própria de grupos progressivos, mas o Elder a aplica sem perder a visceralidade do stoner e a atmosfera lisérgica do rock psicodélico.

Em termos técnicos, “Reflections of a Floating World” se sustenta pela integração entre complexidade e acessibilidade. As métricas alternadas, os riffs intricados e os arranjos multifacetados convivem com melodias memoráveis e momentos de pura contemplação. Esse equilíbrio é o que faz do álbum não apenas uma obra para ouvintes especializados em música progressiva, mas também uma experiência cativante para qualquer público disposto a mergulhar em um som que privilegia tanto a força quanto a beleza.

No resultado final, Elder entrega um trabalho que alia virtuosismo instrumental, consciência estética e identidade consolidada. “Reflections of a Floating World” não é apenas a reafirmação de uma fórmula, mas a expansão de um horizonte musical que coloca a banda entre os nomes mais consistentes e relevantes da cena psicodélica e progressiva do século XXI.


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